– Por Rildo Silveira –
Tráfico de pessoas
O que é tráfico de pessoas?
Da mesma forma que se vendem armas e drogas, há aqueles que comercializam pessoas. Daí porque se usar expressão tráfico de pessoas. Esse tipo de tráfico tem sido facilitado por fronteiras mal policiadas e se tornou em uma atividade de caráter transnacional altamente lucrativa. As Nações Unidas definem tráfico de pessoas como “o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de pessoas, recorrendo à ameaça ou uso da força ou a outras formas de coação, ao rapto, à fraude, ao engano, ao abuso de autoridade ou à situação de vulnerabilidade ou à entrega ou aceitação de pagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa que tenha autoridade sobre outra para fins de exploração. A exploração incluirá, no mínimo, a exploração da prostituição de outrem ou outras formas de exploração sexual, o trabalho ou serviços forçados, escravatura ou práticas similares à escravatura, a servidão ou a remoção de órgãos”. Trata-se de uma restrição à liberdade de ir e vir e ofende os direitos humanos do (a) cidadão(ã).
Como é feito o tráfico de pessoas?
Na maior parte das vezes, as vítimas são recrutadas em seu país de origem através de coerção, engano, fraude, abuso de poder, e até mesmo o sequestro. Ameaças, violência e, até mesmo alegadas dívidas, fazem muitas vezes com que as vítimas concordem com esse tipo de exploração. O tráfico de pessoas não é um fenômeno isolado e tem relações estreitas com outras questões que ameaçam a segurança das vítimas. As vítimas são continuamente expostas à violência física pelos traficantes para assegurar que obedecerão às suas ordens. Muitas vezes, as vítimas são aprisionadas e agredidas de forma a não oferecer resistência aos traficantes. Outras ameaças incluem manter a vítima na completa pobreza por causa da falta de pagamento de salários. As vítimas não possuem proteção oferecidas pelas leis trabalhistas, enfrentam longas jornadas de trabalho e não podem parar de trabalhar nos feriados. Pesquisas feitas pelas Nações Unidas mostram que as vítimas na maior parte das vezes estão procurando uma vida melhor e, por esse motivo, se tornam vulneráveis à manipulação pelos traficantes. As vítimas são recrutadas na maioria dos casos por um parente, um suposto amigo ou alguém parecido no qual elas confiam. Os traficantes e as vítimas normalmente têm a mesma nacionalidade. Em algumas regiões do mundo, mulheres traficantes são selecionadas para recrutar outras mulheres.
Quais são as causas para o tráfico de pessoas?
Algumas das causas para o tráfico de pessoas são: falta de oportunidades de emprego; crime organizado e presença de gangues de crime organizado; desníveis regionais; disparidades econômicas; discriminação social; corrupção nos governos locais; conflitos armados; instabilidade política; lucratividade; marginalização dos pobres; e punição insuficiente contra os traficantes de pessoas, dentre outras. Tráfico de pessoas para exploração sexual. Não existe um termo específico para o tráfico de pessoas com a finalidade de explorar sexualmente as vítimas, mas em inglês tem sido usada a expressão sexual trafficking (tráfico sexual). Muitas vezes, o tráfico de pessoas é feito com a finalidade de obter lucro através da exploração sexual das vítimas. Notícias recentes disponíveis na imprensa escrita, baseadas em pesquisas internacionais afirmam que a exploração sexual corresponde à mais nova forma de escravidão no século XXI. O tráfico sexual inclui a coerção dos migrantes a se prostituírem como uma condição para a finalidade de permitir ou tornar possível a migração. Os traficantes usam de coerção física, enganos e aprisionamento decorrentes de dívidas forçadas como forma de garantir que as vítimas obedeçam. Muitas vezes são oferecidos trabalhos como empregadas domésticas ou mesmo na indústria. Porém, ao contrário de encontrarem trabalho, as vítimas acabam sendo levadas para bordéis, onde lhes são tirados os seus passaportes e outros documentos de identificação. Às vezes, as vítimas são agredidas e trancafiadas e lhes é prometido que somente ganharão a liberdade através do pagamento do dinheiro equivalente ao preço que o traficante pagou por ela acrescido das despesas de obtenção de vistos e custos da viagem. A forma que os traficantes oferecem às vítimas para que ganhem o dinheiro necessário para comprar a sua própria liberdade é através da prostituição. Os principais motivos pelos quais uma mulher e também em alguns casos meninas (menores de idade) aceitam uma oferta dos traficantes é que elas vêm nesse tipo de atividade uma oportunidade de uma situação financeira e de vida melhor para elas e suas famílias. Em muitos casos, os traficantes também oferecem inicialmente uma oferta “legítima” de trabalho e prometem inclusive uma oportunidade para as vítimas estudarem. Os principais tipos de trabalho oferecidos pelos traficantes às vítimas são em bares, clubes, hotéis, contrato de modelo ou empregada doméstica. Os traficantes muitas vezes usam ofertas de casamento, ameaças, intimidação e sequestro como forma de obter as suas vítimas. Também profissionais do sexo que migraram podem se tornar vítimas de tráfico de pessoas. Algumas pessoas sabem que elas trabalharão como profissionais do sexo no exterior, mas elas têm uma visão errada acerca das circunstâncias e condições de seu trabalho no país de destino.
Existem informações seguras sobre o tráfico de pessoas com a finalidade de exploração sexual?
Ainda não. Porém, é necessário perceber a diferença entre profissionais do sexo que migraram por sua livre e espontânea vontade e aqueles forçados a se prostituírem. Crianças e jovens menores de idade, em virtude da sua capacidade de julgamento incompleto, não podem consentir que sejam exploradas e, caso o façam, o consentimento delas não é considerado válido. Porém, vale lembrar que a tendência internacional no momento é de se dar ouvidos a movimentos que, em muitos países, consideram que a prostituição deve ser considerada como atividade ilegal.
Existe diferença entre tráfico de pessoas e contrabando de pessoas?
Sim. O consentimento e a exploração são os fatores que determinam essa diferença na opinião das Nações Unidas. O consentimento tem um papel de relevo para o contrabando de pessoas, pois, nesse caso, as vítimas consentiram na maior das vezes em ser contrabandeadas, enquanto no tráfico de pessoas não existe consentimento válido. A transnacionalidade tem sua função no caso de contrabando, pois esse tipo de ato requer que seja cruzada a fronteira de um determinado país de forma ilegal, enquanto o tráfico de pessoas pode acontecer dentro do mesmo país. A relação entre o contrabandista e o migrante consiste em uma transação comercial que se encerra após cruzada a fronteira. Porém, no caso do tráfico de pessoas, a relação entre o traficante e as vítimas continua mesmo depois de cruzada a fronteira e envolve a exploração contínua da vítima para gerar lucro para os traficantes. Outro indicador da diferença de exploração é a fonte de lucro dos traficantes. No caso do contrabando de pessoas, o contrabandista recebe o seu pagamento para auxiliar as próprias pessoas a cruzarem as fronteiras. No caso do tráfico de pessoas, os traficantes têm um lucro adicional através da contínua exploração das vítimas.
Existe alguma convenção internacional visando coibir o tráfico de pessoas?
Sim, em 15 de novembro de 2000, as Nações Unidas adotaram a Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional (em inglês, Convention against Transnational Organized Crime), também chamada de Convenção de Palermo. Essa Convenção contém dois protocolos (Protocolo para Prevenção, Supressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em especial Mulheres e Crianças e o Protocolo contra o Contrabando de Migrantes por Terra, Mar e Ar). Ambos os documentos possuem elementos das disposições legais vigentes contra o tráfico de pessoas. As Nações Unidas estão cientes de que a cooperação internacional é condição básica para uma resposta de sucesso pelos governos que participam das Nações Unidas. Acordos bilaterais, regionais e internacionais são necessários em adição aos esforços domésticos, para reforçar a aplicação da lei e as respostas jurídicas dadas ao crime transnacional. Um Estado precisa ser membro da Convenção para se tornar membro do Protocolo de Tráfico de Pessoas.
O governo brasileiro tomou alguma medida visando coibir o tráfico de pessoas?
Sim. Essa é uma preocupação constante do governo brasileiro e medidas foram tomadas para enfrentar esse tipo de problema. Como parte dessas medidas, o governo brasileiro assinou a Convenção de Palermo, institui princípios, diretrizes e ações consagrados na Política Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas (Decreto nº 5.948/06, de 26/10/2006), e também lançou o Plano Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas em 2008. Leia na íntegra o Decreto Presidencial que aprovou o texto do Protocolo Adicional à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional Relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em Especial Mulheres e Crianças Os três eixos estratégicos da Política Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas Brasileiras são:
1) prevenção ao tráfico,
2) repressão e responsabilização dos seus autores e
3) atenção às vítimas.
No âmbito da Prevenção, a intenção é diminuir a vulnerabilidade de determinados grupos sociais ao tráfico de pessoas, bem como engendrar políticas públicas voltadas para combater as reais causas estruturais do problema. Sobre Repressão e Responsabilização, o foco é a fiscalização, controle e investigação, considerando os aspectos penais e trabalhistas, nacionais e internacionais desse crime. Quanto à Atenção às Vítimas, foca-se no tratamento justo, seguro e não-discriminatório das vítimas, além da reinserção social, adequada assistência consular, proteção especial e acesso à Justiça. E se entende como vítimas não só os (as) brasileiros(as), mas também os(as) estrangeiros(as) que são traficados(as) para o Brasil, afinal o Brasil é considerado um país de destino, trânsito e origem para o tráfico. Nesse Plano Nacional, afirma-se que a execução integrada é o motor do Plano. Os órgãos responsáveis precisam implementar as atividades de forma agregada, buscando afinidades entre as metas e parcerias, para que não haja, inclusive, repetição de esforços.